[DISCO] Massive Attack "Collected"
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Como se ouve um disco sobre o qual se sabe tudo (ou quase), mas nunca o escutámos? Como é que sentimos as músicas depois de sofrerem um processo de “baralhar e voltar a dar” onde são conhecidos os naipes e os trunfos, mas nunca na mesma ordem do baralho novo que nos habituámos a ver? Com surpresa e entusiasmo ou com indolência e desinteresse?
Aparte destas interrogações metodológicas, o objecto em estudo mostra-nos ingredientes conhecidos apresentados de forma diferente resumindo como vitrina de algo maior e menos superficial como é a carreira do colectivo de Bristol, Massive Attack (MA).
Este lançamento dos MA tem papel de embrulho à escolha: Um para a “classe média” musical que, com um CD apenas se permite a uma aproximação mais rudimentar fornecendo uma leitura rápida dos MA e outro para uma faixa de admiradores convictos, audiófilos crentes e apaixonados pelas potencialidades do multimédia que não dispensam os mimos que um CD/DVD traz. Ambas as fórmulas contêm o que o colectivo cozinhou para diferenciar a refeição de um simples e banal “Best Off”: “Live With Me” (que aqui já falámos) é uma peça urbano-dramática liderada por Terry Callier e exclusiva deste disco. As contribuições dos quatro albúns de MA dispersam-se ao longo do CD de forma não cronológica, o que permite sentir o choque evolutivo da banda, que levou, inclusive à saída de uma das partes do triângulo onde assentava o centro geométrico dos MA, Mushroom que juntamente com 3D e Daddy G trabalharam juntos até “Mezzanine”, disco de ruptura com a linha sinuosa (e talvez por isso, rica) dos MA.
Se “Special Cases”, “Future Proof”, “When Your Soul Sings” e “Butterfly Caught” vestem a camisola de “100th Window”, álbum sobrevalorizado nesta compilação já que mais de um terço das faixas previamente editadas pertencem a este disco, então os restantes minutos mostram outros pontos fortes: Logo no primeiro tema e de forma incontestável o primeiro single dos MA “Safe From Harm”, um hino de amor urbano e tão club-friendly como dantes embalado na voz de Shara Nelson. A equipa recheada de estrelas que ainda jogou em “Blue Lines” com pontas de lança como Tricky, Daddy G, Horace Andy e 3D pontuam no campeonato antigo de “Five Man Army”. Também “Karmacoma” e “Sly” lembram esses tempos (de “Protection”). As vocalizações femininas, sempre convidadas, espalham-se em “Collected” como nos discos onde pertencem originalmente como “Protection” (com Tracey Thorn), “Unfinished Symphaty” (com Shara Nelson), “Special Cases” (com Sinead O'Connor) e “Teardrop” (com Liz Fraser) sendo estes os maiores exemplos.
Ultracondensado, este “Best Off” (ou o essencial sobre os MA em 80 minutos) interroga-nos se, perante uma variedade imensa de sons downtempo e com novas abordagens baseadas na urbanidade e no dub (como o dubstep), ainda existe espaço para a criação e consumo de trip-hop e se ele – em si – não foi mais que uma amálgama amorfa que alguns génios talentosos de vez em quando e quase sempre em Bristol, moldaram dando à luz obras ímpares e essências na música urbana do século passado.
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