[Disco] Massive Attack "Danny the Dog"
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Falar de uma banda sonora, sem se conhecer o filme, é um pouco como falar do acompanhamento, sem saber o que vai ser a comida. No entanto, uma banda como os Massive Attack merece toda a nossa atenção, por diversas razões:
Pela sua importância na defenição de novas estáticas musicais
Pela sua contínua evolução
Por não ser propriamente a banda mais profícua do mundo
Tendo isto em mente, foi com enorme expectativa que ouvi este “Danny the Dog”, a banda sonora para o filme homónimo de Luc Besson. E posso dizer que continuo a ouvir, não com a anterior expectativa, mas com presente prazer.
São 21 trechos, todos instrumentais, sendo a sua heterogeneidade o denominador comum. São portanto, tanto acústicos como electrónicos, tanto calmos como violentos, tanto frios como gélidos, quando não isso tudo ao mesmo tempo. Isto, pois eles aprofundam o caminho já marcado pelo último “100th Window”, onde já pontuavam sons, que eu chamaria no mínimo, de ascéticos. O facto de terem sido e continuarem a ser de tal modo, não deve ser alheio ao facto de terem sido de novo, 3D e Neil Davidge, os responsáveis pelos temas. Estão portanto longe os tempos de tentar dançar o que não se consegue (digo eu). Agora é mesmo ficar sentado, até o albúm acabar.
Os temas são na sua generalidade bastante satisfatórios, antevendo-se uma eficaz ligação com as imagens a que eles se destinam. Isto pois os sons assemelham-se a esculturas musicais, destinadas a representar estados de espírito e situações que nelas fazem sentido. Digamos que para quem ouvir o albúm antes de ver o filme, caso deste escriba, corre o risco de a visão do realizador poder diferir da nossa, ou seja, para algo que visualizámos assim possa sair meio assado.
E puxando assim, de novo a comida, cá fica a minha sugestão para ouvir este albúm. Desta vez nada para comer ou beber, mas sim, um fim de tarde na cozinha, com alguns amigos, enquanto se faz algo que mate a fome no fim deste “Danny the Dog”. Merece no mínimo um belo repasto.
terça-feira, outubro 26, 2004
[Disco \ qualidade de vida] DEAD CAN DANCE INTO THE LABYRINT
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Da profusa e equitante qualidade dos albuns com que os Dead Can Dance (DCD) nos presentearam durante década e meia, é me dificultoso sobressair qual a melhor obra que explana a balustrada de genialidade.
Insiderei por ‘Into the Labyrinth’ visto ser na minha opinião o cd a que mais se recorreram artistas de campos inter-disciplinares diversos, nas suas actividades criativas. De facto, muitos são os projectos musicais de raízes análogas influenciados pela a mestria do par da AD , Brendan Perry e Lisa Gerrard.
Inspirados pelos os distintos habitats hemisféricos em que vivem, sejam Londres ou a natura da Nova Zelândia, outras civilizações e partituras étnicas foram abarcadas através das viagens que só um espírito iluminado e curioso podem alcançar.
Na dramaturgia cénica, assiste-se durante a década de 90 muitas encenações que não deixaram de recrutar a magnifiência e beleza das composições dos DCD . Quadrícas paisagísticas no tempo e espaço por onde se espelham as emoções das palavras e as expressões dos rostos e da alma humana. Facto constatado desta simbiose, foi a visceral interpretação do actor consagrado chileno Hector Nouguera, na peça ‘Executor 14’ de Adel Hakim, onde ‘yulunga ( spirit dance )’ foi sublime epitáfio da subjugação carnal aos espirítos amedrontados.
Momix, a companhia de saltimbancos refinados que entre a dança e o teatro, construem belos momentos de exclamação, também recorreu a ‘carnival is over’.
Os inúmeros documentários e reportagens televisivas usam colagens de marca de àgua DCD para atingir o mais próximo do possível o efeito de envolvimento dramático.
As artes cinéfilas sejam curtas ou longas metragens igualmente conseguem neste momento atrair e absorver parte das energias de Mr Perry e de Miss Gerrad após a finalização do projecto em 1997.
A dança contemporânea é seguramente uma àrea onde proficuamente todos os anos se assistem coreografias suportadas pelo o mote ( DCD), e que bem que fica ‘Emmeleia’ no movimento de um corpo de uma mulher...
Um destaque ainda para a ultíma faixa ‘How fortune the man with none’ que constitui uma maravilhosa homenagem aos homens justos e sábios da História nas palavras do poeta dramaturgo Bertolt Brecht e que a voz de Brendan conferiu em adição maior solenidade. É na minha optíca uma das mais belas melodias por mim escutadas e eu não tenho dúvida em considerá-la uma das melhores peças do já mitíco portofólio dos soberbos Dead Can Dance.
SITE OFICIAL : http://www.deadcandance.com/
www.hectornoguera.cl/9-na27fo01.jpg
http://www.hectornoguera.cl/galeria-fotos-ejecutor14-2.htm
http://www.hectornoguera.cl/galeria-fotos-ejecutor14-2.htm
www.momix.com
segunda-feira, outubro 25, 2004
[DISCO] Plaid "Double Figure"
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Talvez desiquilibrado, este “Double Figure”. Estranha, sem dúvida a evolução dos temas neste trabalho, o completar de uma sequência iniciada com “Undoneson”, “Not For Trees” e “Restroof Clockwork”.
A justificação de um trabalho desiquilibrado surge pela variável da qualidade dos temas apresentados: Se, de facto, “Eyen” surge como uma faixa belíssima e de enorme interesse (mas não emblemática deste mar de electrónica abstracta de “inteligent dance music” fundida com melodias mais orgânicas e –quase – chill out como “Zamami”) outros temas são sofríveis. São as quatro primeiras faixas que marcam “Double Figure”. Além de “Eyen” e “Zamami” ainda temos uma exploração electroclash (quer queiramos ou não os Fischerspooner devem ter ouvido este albúm) em “Squance” (MP3) mas um pouco mais escura e minimal quando comparada com as reminiscêncis “eighties” que se espalham pelo mercado. “Assault on Predict Zero” dá o mote para as restantes faixas (são 19 ao todo) em que a electrónica emerge sem pudor de uma forma mais experimental (“Silversum”, “Ooh Be Do” – uma grande faixa – e “Twin Home”). O electroacústico é explorado com grande mestria neste trabalho de Plaid conferindo-lhe o sabor principal de “Double Figure” sendo exemplos conseguidos em “Ti Born” onde o breakbeat se confunde com o sax e a linha de groove por baixo ou ainda em “New Family”, um tema intenso em jeito midtempo com teclados quase clássicos. O disco de 70 minutos termina com “Mayme”, sombrio, lento, arrastado e vocalmente condimentado a pedir um genérico de filme de suspense de Domingo à noite onde as forças humanas retemperadas de fim de semana já se esvairam antes de uma semanda de trabalho.
A estética do albúm é um cruzamento entre tecnologia (ilustrada pela linhas de um aparelho de televisão) um urbanismo só e citadino, tudo isto encaixado numa gama de cores frias com pondo um inlay pouco esclarecedor do que se pode ouvir no CD.
“Double Figure” é um disco que se entranha nos primeiros 20 minutos e se estranha nos restantes, mas que precisa de alguma persistência própria de quem espera por uma nova baforada fresca na IDM.
+info:
site oficial do albúm
info sobre os plaid na warp
site oficial
[WARP "Double Figure" WARPCD84, 2001]
nota: abrir os links das músicas numa nova página
sábado, outubro 23, 2004
[Concerto] "Siouxsie: Dream Show"
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É complicado explicar o que leva uma pessoa a fazer 2300 kilómetros para ir ver um concerto, ou a importância que o mesmo terá para quem faz tal viagem. Por isso, não é só de música que aqui se escreve. É de paixão por ela, num sentido que se quer dúbio.
Quinze de Outubro, um fim de tarde londrino e a vista que o Royal Festival Hall oferece sobre o Tamisa. Sala cheia e impaciente por uma noite que se sabia especial. Este seria um de dois concertos em que Siouxsie interpretaria temas de toda a sua carrreira, quer como membro dos Siouxsie and The Banshees, quer como membro dos The Creatures. Não fosse já esta uma razão suficiente para tornar o concerto especial, ela estaria ainda acompanhada por Budgie (baterista), e por: (espero não esquecer ninguém): Millennia Ensemble (pequenas secções de cordas e metais), Leonard Eto (percussionista, tambores japoneses Taiko), coro feminino (duas gémeas, sério), um guitarrista/baixista, um teclista, um percussionista e um ocasional multi-intrumentista. Portanto mais de vinte pessoas em palco, com um propósito: tornar a noite verdadeiramente especial.
Músicos chegam aos poucos a um palco por iluminar. Primeiros sons reconhecíveis do último “Hái!” dos Creatures, permitindo um longo diálogo entre tambores japoneses e bateria, diálogo esse que encheu a sala por completo. E estava eu a constatar a qualidade acústica da mesma, quando por fim chega a mais desejada.
Um longo kimono acetinado, preto sobre branco. Cabelo adornado com penas vermelhas, que davam um pouco de cor à sua figura. Uma indumentária a condizer, não só com os sons mais orientais do de “Hái”, mas também com a sua elegância e sensualidade.
Os temas vão desfilando, primeiro os novos Creatures, depois os mais velhinhos Banshees. A sensação, que sempre ficaria, é que por cada um deles, dez faltariam sempre, tal é a extensão e qualidade da carreira em questão. Por isso, falar deste concerto, é falar de uma imensa satisfação por ouvir temas como “Face to Face”, ou “Obssession”, ou o surpreendente “Right Now” mas ao mesmo tempo da ausência dos outros respectivos trinta.
Para minha surpresa, soaram-me melhor as canções dos Creatures que as restantes. De facto, a percussão reforçada, puxou estes temas para opulências que as canções mais viscerais dos Banshees não o conseguiriam fazer. Exemplo claro disto, resultaria da comparação entre um “Dear Prudence” e um “Prettiest Thing”. Enquanto a primeira soa menos bem sem os ácidos característicos, já a segunda sai melhorada pela companhia sinfónica. Talvez seja eu, mas embora gostasse de ouvir o The Thorn na íntegra, ou o Fireworks, ou o Dazzle, ou tantos outros com toda aquela gente a tocar... a verdade é que os Banshees sempre foram algo de mais imediato e primário, para susterem tanto requinte em pormenores orquestrais.
Por isso quando se acaba o concerto com o “Spellbound”, admito que o “Extermination Angel” me pareceria melhor. Mas isso já são pormenores de quem se apaixonou pela música dela há muito. Coisas de quem se apaixona pela música...
quinta-feira, outubro 21, 2004
[info] Halloween Festival Party 2004
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Oportunamente lembrado no nosso sistema de comentários, fica aqui assinalado o evento organizado pela "Sound Factory" para o Halloween deste ano. O "Halloween Festival 2004" repartir-se-á por duas noites e vai ser no Porto (Sábado, dia 30, na discoteca Swing; Domingo, dia 31, no Hard Club), e contará com a presença de nomes notáveis da música alternativa: Spetsnaz (SWE), Nuklear Dawn (POR), The Last Dance (EUA), Sex Gang Children (UK) (!!!), HOCICO (MEX). De sublinhar, sem dúvida, a primeira presença dos míticos Sex Gang Children, em terras Portuguesas.
O "Halloween Festival 2004" promete mesmo ser um grande evento ansiado por muitos.
O programa e outros detalhes podem ser encontrados em http://www.soundfactory.org/.
quarta-feira, outubro 20, 2004
[INFO: net] Absorb e Ishkur's Guide To Electronic Music
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O site da ABSORB, recentemente encerrado, constitui um arquivo electrónico-musical vasto, principalmente no que toca a concertos ao vivo de artistas pouco convencionais e transparentes ao olhar comum. Contém uma vasta colecção de artigos sobre discos, perfomances ao vivo e uma rádio. Será nas opiniões de espectáculos ao vivo que a ABSORB passa a vencedora: a quantidade e variedade de fotos sobre esses acontecimentos, ilustrados por uma descrição dos momentos vividos é esmagadora. Thomas Fehlmann, Kraftwerk, Asian Dub Foundation, Future Sounds of Jazz, µ-Ziq, Antipop Consortium ou Ladytron são alguns escassos exemplos.
+info:
Absorb
O Ishkur’s Guide to Electronic Music é uma obra hercúlea no que toca à pesquisa genealógica das inúmeras correntes da electrónica actual, bem como à sua catalogação e colecção de exemplos. Isto é, são-nos apresentados sete géneros musicais (house, techno, trance, breakbeat, downtempo, jungle e harcore) que se subdividem e se entreligam. Para cada subdivisão temos um texto com uma explicação frugal da origem e artistas emblemáticos e até dez exemplos musicais. Pela percepção clara de “o quê vem de onde” vale bem a perda de algumas horas.
+info:
Ishkur’s Guide
sábado, outubro 16, 2004
[INFO] Daddy G na série DJ Kicks
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O line up do disoco já é conhecido e contém algumas pérolas dos temas dos MA a solo (caso de “Karmacoma” numa mistura rara) ou com outras colaborações incluindo, ainda nomes de peso do Studio 1.
+info:
site da !K7
quinta-feira, outubro 14, 2004
[banda] The Gathering: do 'metal' ao 'trip-rock'
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Em 1994 Anneke van Giersbergen (actual vocalista) junta-se à banda e seguem-se álbuns marcantes, e ainda pesados, mas com a diferenciação fundamentalmente levada a cabo pela mistura de um metal algo atmosférico e a voz distinta da vocalista: "Mandylion" e "Nightime Birds".
"How to measure a planet?" marca uma vontade de mudar numa outra direcção. Um álbum experimental e que se separa já do metal.
Em 2000 surge o imprescindível "if_then_else", um álbum já distintamente rock, diversificado mas intenso. Os registos seguintes, "Black light district" e "Souvenirs" (tal como o "Sleepy buildings") definem finalmente a banda dos dias de hoje com um som rock atmosférico e emocional.
Por esta sucessão de mudanças no seu som, estranho é reparar que muitos dos indefectíveis fãs dos tempos do metal se vão mantendo ainda hoje. Apesar de tudo esta "evolução" para a banda do presente foi natural e coerente. Sem nunca se envergonharem do som que os iniciou e impulsionou, como declararam numa entrevista, hoje vão preferindo enveredar por caminhos experimentais, mais calmos, mas sempre intensos. Claramente uma banda que nunca estagnou, é interessante reparar que as mudanças na orientação no som produzido foi acompanhado à altura pelos membros da banda. Os tempos do rock atmosférico até poderão não estar para ficar, até porque Hans Rutten, o baterista, recentemente referiu que se sente alguma tensão e vontade de voltar às músicas mais pesadas e 'guitar-oriented'. Uma coisa é provável, a mudança vai continuar, e esperemos que com uma lógica semelhante.
Este post surge como consequência da recente visita que os The Gathering fizeram a Portugal (no Festival da Ilha do Ermal), e principalmente devido à próxima visita já no próximo mês de Novembro nos dias 19 e 20 no Porto (Hard Club) e Lisboa (Paradise Garage) respectivamente. A avaliar pelo que têm apresentado, será um concerto a agradar ambas as "legiões" (os fãs antigos e os recentes), com espaço para os clássicos da altura mais pesada, muito espaço para o som actual e consequentemente espaço para o experimentalismo.
Para aguçar o apetite, deixo um link interessantíssimo para um site com um recente concerto deles online (streaming video). Está em http://www.fabchannel.com e só precisarão de se registarem gratuitamente e procurarem por "The Gathering (a 02/03/2004)" no menu à direita. Depois é tempo para "gozarem" o momento e deliciarem-se com um concerto mesmo muito bom e que não deverá ser muito diferente daquilo que vamos poder ver dentro de pouco mais de um mês.
Site oficial dos The Gathering
segunda-feira, outubro 11, 2004
[Disco mais marcante] "Hope Blister" ...smile´s ok
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"...smile's ok"- THE HOPE BLISTER, 1998, 4AD
Um diamante. Polido com uma delicadeza apenas comparável ao seu requinte. São oito faces, cada uma na forma de uma música, cada uma cristalina, límpida mais ainda que aquelas que lhe deram origem. Sim, porque este é também um disco de versões, no seu sentido mais preciso.
Para melhor explicar e deixar a crueza dos factos para trás, este é um projecto de características fraternas àquele que dava pelo nome de This Mortal Coil (TMC). É-nos, aliás, anunciado como "...sort of a sequel to TMC", sendo que o que mais os distingue é que aqui existe apenas uma voz e um conjunto fixo de instrumentistas, o que para quem conhece os TMC, saberá decerto não ser aí o caso. Desta formação estável surge assim uma obra coerente, onde cada música ocupa um espaço intricadamente indissociável daquele que as restantes ocupam. Uno, o que neste caso marca a diferença.
As versões que passam por nomes como David Sylvian, Brian Eno ou Jonh Cale, reflectem o extremo bom gosto de quem fez o favor de idealizar e lançar esta obra. Obrigado Sr. Ivo Watts-Russell[1].
A elegância, uma das propriedades intrínsecas deste albúm, reflecte-se, como não podia deixar de ser, no aprumo com que todo o trabalho gráfico nos é apresentado. É quase um lugar comum referir esta característica quando se mencionam as edições da 4AD, mas é sempre reconfortante sentir que seis anos passados, quer o visual, quer o por lá se ouve e sente continuam a fazer-nos acreditar que não há nada como um disco assim.
Finalmente, fica deixo a minha sugestão para o acompanhamento. Este disco é sem dúvida para saborear com amigos íntimos, aqueles a quem o mútuo silêncio não incomoda. Dois cálices de Fonseca, Vintage, colheita de 94, para desgustar calmamente nos cerca de três quartos de hora que este disco ocupa, ao entardecer prenunciador de uma noite de invernia. Vê-se bem daqui, pelas nuvens ao largo da costa.
[1] Todos os agredecimentos deste mundo, não só por isto mas igualmente pelo imenso catálogo de que a 4AD se pode, justificadamente, orgulhar.
Info sobre Hope Blister
[disco mais marcante] Alpha - Come From Heaven
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As grandes peças discográficas não se fazem de apenas um conjunto de boas musicas, mas sim de experiências completas em cordas temporais que paradoxalmente são sentidas como adimensionais. Esses efeitos são completamente conseguidos em COME FROM HEAVEN, pois ao serviço da obra, uma trindade vocal composta por Martin Barnard, Wendy Stubbs e Helen White, soube encaixar na perfeiçao emoções aglutinantes permitindo a espiritualizaçao dos trechos sonoros. O fio condutor de cada interpretaçao às vezes estravasa-se em euforias incontidas , outras vibrações porém em azias sentimentais tendo a tipo de exemplo a voz plácida e degustante da poetisa samplada resultando o todo, numa displicência de palavras e num visual celuloide cinematográfico. A veneração dos artistas pelo o material de Burt Bacharah printa-se igualmente em faixas mais desconprometidas e libidiosas. A extensão do prazer fica-nos nos lábios quando recordamos do derradeiro momento onde Wendy Stubbs ensona ‘ Somewhere not here ‘.
Para quem um dia pensava encontrar um registo de excelência, para que de certa forma referenciar-se e opinar maduramente sobre projectos do mesmo âmbito, COME FROM HEAVEN, qual dádiva divina ganhou esse galardão. Considero que o debutante trabalho dos Alpha foi para mim um importantíssimo impulso de descoberta da musica ligeira \ soul dos anos 70, assim como passaporte introdutório ao eclético mundo do jazz.
Agrada-me saber que passado precisos oito anos que adquiri o cd (11\10\1997), esteja acabar de escrever estas linhas no mesmo dia em que os Alpha actuam na cidade do Fundão, o que obviamente é sempre de louvar quando a boa musica se manisfesta fora do habitual binómio atlântico Lisboa-Porto.
Site oficial dos Alpha
[discos mais marcantes] Três selecções
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Antes de mais vou deixar uma pequena nota introdutória que servirá, sobretudo, para antecipadamente responder a algumas questões que se poderão levantar quanto à disparidade na selecção que fiz sobre os discos mais marcantes da minha vida. Site oficial dos Ratos de Porão ¤ ¤ ¤ ¤ ¤ Oxiplegatz – Sidereal Journey [1998, Season of Mist] ¤ ¤ ¤ ¤ ¤ Faith and the Muse – Annwyn, Beneath the Waves [1996, Tess Records] Não foi fácil para mim seleccionar um disco que se adequasse às minhas preferências actuais. No entanto, após um momento de concentração, restaram-me poucas dúvidas em seleccionar este.
Será fácil perceber que é impossível resumir as preferências musicais de alguém através de apenas três discos ou bandas. Os meus gostos abrangem diversos estilos que, por acaso, até tiveram a minha preferência quase por ordem cronológica. É por essa ordem também que me vou referir brevemente às minhas três escolhas.
Ratos de Porão – RDP ao Vivo [1992, Estúdios Eldorado]
Os Ratos de Porão são brasileiros e surgiram em 1981 (!!!).
Estávamos em 1993 quando este disco violentíssimo chegou às minhas mãos. Não conhecia Ratos de Porão e foi preciso ouvir este disco mais de dez vezes para começar a gostar. Os RDP, na altura, representavam a mistura trash e punk mais agressiva que jamais conhecera (e conheci), e foi neste álbum ao vivo que me revi na altura. Vários minutos de pancadaria bárbara que, a princípio parecia não ter nexo, me mostraram no entanto que este é o disco que em grande parte terá conferido à banda o carisma que ainda hoje possui. É neste disco ao vivo que ficaram demarcados aqueles que viriam a ser os clássicos dos clássicos dos RDP. Quase que me atrevo a dizer, até, que todas as músicas que entraram nesta edição se tornaram clássicos da banda. São mais de 27 temas (porque existem faixas escondidas) de crítica social, denúncias, gozação e revolta, em que se incluem memoráveis versões de músicas de bandas como os “Olho Seco” e “Extreme Noise Terror”.
Muito provavelmente no auge da sua forma, os Ratos tiveram ainda a ajuda de o som estar mesmo muito potente (embora julgue que não tenham rebentado nenhuns PA’s neste show, como aconteceu num outro bem mais recente). Aliando isso às frases peculiares que o seu líder João “Gordo” vai dizendo entre músicas, bem como a participação entusiasta do público que estava presente, estavam criadas as condições para surgir o disco que ainda hoje vou buscar quando tenho vontade de reviver esses tempos. Cada vez que o faço arrepio-me.
Numa altura em que o metal mais pesado já me ia entediando, por escassearem aqueles que se destacassem com algo realmente novo, eis que adquiro um álbum que mudaria a minha orientação musical. Oxiplegatz é um projecto a solo do sueco Alf Svensson, que já participara em bandas punk e metal (como os conhecidos At The Gates), bastante arrojado. A exemplo disso surge este álbum com cerca de 40 minutos em que é “abolido” o conceito de “músicas”, visto que se apresenta com uma só música ou peça (apesar disso o disco está dividido em 33 faixas com o único propósito de facilitar ao ouvinte a seleccionar as suas partes favoritas). Na realidade esta opção faz todo o sentido quando nos apercebemos que este disco é uma história só, sobre uma raça alienígena que se lança no universo desconhecido à procura de um novo planeta, visto que o seu tem os dias contados.
Num álbum em que se notam nitidamente, aqui e ali, as influências de punk e black metal (e mesmo tendo em conta que o autor se tentou abster, mais do que nunca, de qualquer influência), foi aqui que encontrei o som que a minha vizinha de baixo apelidou de “música do espaço”. É neste disco que algumas nuances típicas do black metal se transformaram, pelo menos para mim, num som bem mais perto do gótico. Não estará certamente alheia a isso a participação especial de Sara Svensson, com registos vocais notáveis. De referir o interesse que existe em reparar que as sonoridades mais pesadas vão surgindo nas situações da história de maior intensidade e stress, intercalando com momentos de introspecção e melancólicos.
É um álbum incrível, para muitos uma obra de arte, que de vez em quando me vejo “obrigado” a ir buscar, porque é daqueles discos que não cansa nem enjoa. Antes pelo contrário.
Talvez por ter elevado a fasquia tão alta, não foi editado mais nenhum registo de Oxiplegatz desde então.
Oxiplegatz na internet
Era capaz de ficar várias linhas a enaltecer esta banda americana, da qual se destaca claramente (na minha opinião) este álbum. Muitíssimo equilibrado, será o disco que melhor descreve a banda. Com a influência demarcadíssima de bandas góticas de culto, os Faith and the Muse apresentam um disco recheado de ambiente, romantismo, fúria e solenidade. Com um som extraordinário para testar sistemas de som e estruturas anti-sísmicas (eh eh eh), encontrei neste disco de tudo um pouco daquilo que vemos nos outros seus outros registos. Tanto somos transportados para meandros do século XVIII, como depois para sábias terras pagãs, e de seguida para um qualquer clube noctívago e negro de Londres. Desde canções rock intensas, até à subtileza soberba de outros temas (ora com a voz motivante de Monica Richards, ora com o registo sombrio de William Faith), sempre suportado com letras fora do comum, somos a pouco e pouco arrastados até à negridão que transportam. A diversidade que o álbum carrega torna-o um dos mais poderosos e bonitos que já alguma vez ouvi e mesmo não possuindo distintamente influências das bandas onde Richards (Strange Boutique) e Faith (Christian Death, Shadow Project, Mephisto Walz and Sex Gang Children) participaram anteriormente, estou certo que terá sido um dos melhores discos que fizeram. É um dos álbuns que mais me marcou e é daqueles em que não se consegue seleccionar esta ou aquela faixa. Vale mesmo como um todo.
Site oficial dos Faith and The Muse
[DISCO: marcante] “Blue Lines” Massive Attack
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Se existe trip-hop na actualidade é por causa deste disco. De facto, a “crew” dos Massive Attack (MA) - que emerge de um colectivo apelidado de “Wild Buch” – é composta por alguns génios urbanos (Nicolette, Martina, Tricky, Horace Andy, 3D, Del Naja, Shara Nelson e Mushroom), e consegue marcar Bristol no mapa. Dessa sopa de influências (nos “sound systems” no final dos oitentas) sai “Blue Lines” em 1992.
Numa altura que “groove” e “cool” eram termos reservados ao hip-hop e funk, os MA apropriam-se destes termos, reescrevem-nos, cozinham-nos e condimentam-nos com poesia urbana. As misturas de géneros enriquecem este disco: hip-hop, funk, soul (“safe from harm”), dub (“five man army”), reggae (“one love”) e uma pitada de rap mais agressivo.
Acredito que este trabalho debutante dos MA tem como razões de sucesso o facto de ter dois objectivos até então não miscenizáveis: “Blue Lines” é claramente “club-friendly”, mas cumpre com glória como banda sonora de uma vida urbana. Além disso, a própria mestria do trabalho não deixa créditos por mãos alheias: “Unfinished Sympathy” foi “single” da década no Melody Maker.
A abertura destes 45 minutos fazem-se com Shara Nelson em “Safe From Arm”, “o” single dos MA onde o soul nos enche as medidas, mas mostra-nos um som escuro, mas fluido. Em “One Love”, um hip-hop abstracto ilustrado com linhas de piano e com o “scrach” de Mushroom a seguir a voz de Andy. “Be Thankful For What You’ve Got” alicerçado em Tony Bryan (mais uma colaboração dos MA) deixa sentir o groove aninhado num funk muito positivo. “Five Man Army” é o dub que brota do colectivo: Tricky e Dady G degladiam-se entre rimas. Chegamos ao par de ouro neste disco: “Unfinished Sympathy” e “Daydreaming”. Enquanto a segunda faz a afirmação da banda enquanto grupo que bebendo melodias aos anos oitenta e nos reconforta como uma chávena de uma bebida quente num dia chuvoso, “Unfinished Sympathy”, o clássico dos MA é mais cortante e angustiante; Mostra a voz de Shara Nelson e a forma como esta dá ao seu instrumento vocal um dos melhores poemas do disco. “Hymn Of The Big Wheel” produz um efeito opiáceo em quem ouve: um sedativo em downtempo com Horace Andy a transmitir a sabedoria de um velho (quase contra-natura num disco tão urbano) e a paz de um mundo explicado tão facilmente que adormece entre cigarras.
“Blue Lines” marcou uma geração de apreciadores de música. Quem cresceu a ouvir música nos noventas, não esquece pelo menos “Unfinished Sympathy” ou “Safe From Arm” que representam um albúm seminal na compreensão da moderna música urbana que nos mostra um futuro rico (basta atentar na carreira dos MA), mas não esquece as suas origens.
> Site oficial dos MA
> 100th Windows (site da última digressão)