[concerto] Luís Delgado & ‘ Tânger ‘
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O concerto decorreu no dia 26 de Abril no Teatro Principal de Alicante/Alacant sob o título de ‘Tanger’.
Desfilaram maioritariamente os temas do novo CD, onde se evidencia o novo rumo do autor, na preferência pelo registo acústico, mais orgânico e ritual da qual não será alheio o facto de ter sido gravado ao vivo na ‘cidade branca’ africana de Tânger.
‘El diwan de las poetisas’ foi o instrumental de abertura que antecipava o que seria uma noite em espiral numa sala de cor aureo-celeste e de formas elegantemente boleadas.
O tema segundo foi, para mim, um encontro com a História, pois Delgado soube a meias com o poeta Ibn as Santarini, nado no século XI em Santarém (à época pertencente ao Tarifado de Badajoz) traduzir com perfeição, no seu alaúde uma dupla cantiga de amor e um texto dedicado a ‘Sulayr’, a serra Nevada.
Da mesma contêmporaniedade temporal e do mesmo eixo meridional, da cidade de Valencia del Cid, o também poeta Ibn al Zaqqaq, um iluminado que em domínio Almorávida nos legou ‘El Saludo’, ‘El cinturón y el brazeleta‘, ‘Amanecer en la mar’ e ‘La aurora nocturna’ foram alvo das interpretaçoes sagazes dos seguintes músicos:
Luis Delgado (alaúde califal, bendhir, guimbri e santur); O Trio de ‘Tangerinos‘; o ancião Larbi Akim no alaúde; Jamal Eddine Ben Allal no violino; Mohamed Serghini El Arabi na viola e com a conceituada e premiada voz; nos sopros, Jaime Muñoz; nas percussoes David Mayoral; e no acordeão Cuco Pérez.
Numa descrição generalista do espectáculo pela veia poética, a dissecação emocional do tema ‘La aura nocturna‘. M.S. El Arabi soube bem cantar a brisa que percorre um céu estrelado sustento por avenidas de colunares palmerais, nas serpenteadas voltas dos aromas e das vaidades dos roseirais, nos rendilhados de pedra e água, na antevisão da beleza que se perfila ao horizonte, no dorso de uma donzela morena autora prateada, mas que se afinura em pó de ouro quando a luz da aurora desperta e faz florescer as pétalas das Amendoeiras. A esta sensibilidade junta-se a capacidade de Delgado e seus companheiros povoarem com o éter dos sons, as paisagens e as arquitecturas da natureza e das cidades na forma de belos instrumentais. ‘Tirwal’ foi um exemplo.
A finalizar, a mais explosiva das performances, a voz vibrante de Mohamed ‘encheu’ e os ritmos percussivos afirmaram-se no mais dançável momento musical.
O apontamento negativo terá sido o tom dos graves, que estava um pouco esquecido assim como maior visibilidade que se esperaria do acordeão, flautas e percussões, que não deslumbraram tanto como podiam.
A música tem a estonteante capacidade para forjar imagens, no dia 22 de Março em Barcelona assisti no concerto dos Dead Can Dance, ao ajustamento do centro da nossa galáxia nas cordas vocais de Lisa Gerrard. Hoje pude comprovar que o Estreito de Gilbraltar, não passa disso mesmo, um estreito por que se ultrapassa como quem come uma laranja, distraído em ideias iluminadas.